Critica | Ainda estou aqui!
imagens/ Sony Pictures
"Ainda Estou Aqui" opta por contar uma história de resiliência, apesar da violência da ditadura. É um filme sobre família, sobre afeto, sobre manter-se unidos e juntos, apesar do terror. Não é sobre quem parte, é sobre quem fica."Fomos conferir este filme que tem seu roteiro inspirado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, lançado em 2015. O escritor, dramaturgo e jornalista paulista é filho de Rubens Beyrodt Paiva, deputado federal pelo PTB entre 1963 e 1964, cassado durante a ditadura, exilado e, após retornar ao Brasil, preso e morto, em janeiro de 1971.
O caminho tomado pelo diretor Walter Salles em "Ainda Estou Aqui",
é o de uma produção muito sóbria, sem grandes arroubos emocionais na dramaturgia, mas com um imenso componente sentimental e força política. São os bastidores familiares dessa história que o filme revela, num drama histórico que aborda o nosso regime militar sob a ótica da tortura e assassinato dos “inimigos do Estado”.
No Rio de Janeiro no ano de 1976 a família Rubens Paiva vive contente em seu casarão enorme no bairro de luxo do Leblon, em frente à praia. Enquanto os cinco filhos passam as tardes mergulhando ou jogando bola, Rubens (Selton Mello) e Eunice (Fernanda Torres) recebem amigos, ouvem música e almoçam juntos. Era uma vida boa, apesar do contexto da ditadura, até que um dia homens mal-encarados batem à porta e levam Rubens para um interrogatório. E Rubens nunca mais retorna. Diante do desespero, ver-se sozinha e mãe solo de cinco filhos, Eunice buscará forças para tentar encontrar o marido e criar os filhos apesar da fissura que se cria em sua família por causa da ausência de Rubens.
Nesse elenco enorme, são as mulheres que se destacam. Do núcleo jovem, Bárbara Luz (que faz a Nalu Paiva) chama a atenção pela característica observadora de sua personagem, linkando os acontecimentos sem necessariamente falar em voz alta. E, claro, Fernanda Torres, em seu melhor papel de sua carreira, entregando uma Eunice vibrante em um primeiro momento, que se transforma a partir dos episódios e se torna uma mãe contida, que precisa para sempre reter a enxurrada de emoções para não deixar transbordar aos filhos a tragédia que se abateu na família. Diferentemente de outros filmes dramáticos, em que vemos as personagens sofrerem horrores, a atuação de Fernanda Torres neste é silenciosa, o que torna tudo muito mais difícil, pois ela precisa transmitir toda a angústia dessa mãe sem esboçar nenhum fio de desesperança. Não é qualquer um que consegue esse nível de excelência de atuação.
imagens/ Sony Pictures
Mas não é somente o elenco feminino que se sobressai no ótimo trabalho de criação dos personagens reais. Selton Mello (que tem mesmo uma impressionante semelhança com Rubens Paiva) está ótimo na pele de um homem rico, politizado e anti-fascista, que tenta manter escondida a ajuda dada às pessoas que precisam fugir da perseguição do regime, passando os recados a familiares, amigos e camaradas. A outra faceta do personagem é a de um pai de família divertido, com projetos imobiliários em andamento e uma vida comum. A ilha de conforto financeiro e aparente isolamento das “garras dos milicos” na qual a família Paiva vivia, é muito bem representada no tempo em que o ator está em cena, uma fase que muda por completo quando acontece sua prisão, trazendo ao filme um tom fotográfico mais escuro, interpretações ainda mais sóbrias e um pouco menos de alma e muita objetividade milimétrica por parte da direção, começando com a prisão de Eunice e Eliana Paiva (mãe e filha, respectivamente) e terminando com as reparações históricas vindas com a emissão da certidão de óbito de Rubens Paiva, em 1996, e as revelações que vieram à tona com a Comissão da Verdade, em 2012.
Por se passar em três tempos — infância, jovem adulto e adulto — a produção acaba tendo um elenco enorme, com nomes conhecidos do público como Marjorie Estiano, Daniel Dantas, Humberto Carrão e, claro, Fernanda Montenegro, em sua rápida aparição, protagoniza a cena mais intensa do filme, aquela que se você não chorou até aquele momento, bom, é ali que ela te derruba. Mesmo pontual, é a cena de Montenegro que faz a conexão do título e que arremata toda a história.
imagens/ Sony Pictures
O Longa já esta disponível nas telonas e opta por contar uma história de resiliência apesar da violência da ditadura. É um filme sobre família, sobre afeto, sobre manter-se unidos e juntos, apesar do terror. Não é sobre quem parte, é sobre quem fica. Merece todos os prêmios que tem ganhado e, sim, tem boas chances de ser indicado ao Oscar, e em mais de uma categoria. Tomara!
Estamos na torcida!
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